Tenondé Porã

Tenondé Porã

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Entrevista



Olá Revirados !

Como estão ?

Depois do segundo mutirão na Tenondé, estamos em processo de reunirmos-nos para uma avaliação do feito e a programação de nossos próximos eventos. Aguardem.
Neste sábado tivemos aqui na Paulista a manifestação contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte. Esta foto, foi de um Toré (ritual dos povos Xingu) em plena Paulista.
Recentemente, fui convidado a dar uma entrevista numa revista, que não vou citar o nome, por ética, voltada a professores, a revista teria como matéria de capa o Amazonas e claro falaria-se sobre indígenas. Mandaram-me as perguntas, respondi e obviamente que não foi publicado, assim como muita coisa que relaciona-se com os índígenas brasileiros é ocultado e não é de interesse de certas mídias pautar a situação daqueles que se empenham em lutar para a preservação de seus povos e do meio ambiente. E falar sobre indígenas sempre foi um assunto espinhoso, porém a internet demonstrou desde o início que as pessoas não querem só consumir coisas produzidas por uma minoria, querem também produzir suas próprias notícias.

Segue abaixo a entrevista com minhas respostas. Gratidão a jornalista que também não vou citar o nome, por respeito, assim como a argumentação dada do porque da entrevista não ser publicada. Rs !

No que se baseia a cultura indígena? A cultura indígena por si só, já é excelência, tem seus costumes, modos de vida e tradições. Ressalvo que a cultura indígena precede 511 anos da 'invasão' dos portugueses, e assim como toda cultura passa por transformações.
O índio é tratado como igual na nossa cultura? Não, os índígenas ainda são invisíveis na nossa sociedade e em alguns estados como é o caso do Mato Grosso o preconceito contra eles é muito pronunciador, e ali também concentra 57% de assassinatos aos índígenas. No começo deste mês (julho) teve um caso inédito no país em que um advogado criminalista, e jornalista Isaac Duarte foi condenado a 2 anos de prisão por preconceito contra indígenas.
Como funciona a educação indígena? A educação indígena tradicional assim como a maioria de seus conhecimentos é passada oralmente, aprendem primeiro a sua  língua - o que é excelente - pois é seu maior patrimônio, quando se morre uma língua, é mais fácil a cultura ser solapada. Contudo a pedagogia convencional ainda é aplicada. Foi aprovada uma lei de ensino diferenciado para indígenas, onde alguns materiais didáticos são na língua daquela etnia e conteúdos e atividades programáticas são vivenciais e isso tem eficácia com os indígenas, tivemos um avanço, mais abro parênteses, que um prédio quadrado, o indígena sentado na cadeira reproduzindo o que se escreve na lousa, avaliação de disciplina e uma carga horária a ser cumprida. Esse ensino NÃO é diferenciado para indígenas.
As formas de caça e procura por comida ainda são as mesmas? Num âmbito nacional, sim, as tecnologias tradicionais sobrevivem, assim como passam por transformações, agora aqui na cidade de São Paulo na aldeia Tenondé Porã de etnia Guarani Mbyá no bairro de Parelheiros, onde desenvolvo um trabalho, está fadado acabar.
Como funciona a hierarquia da tribo? As aldeias são formadas por associações, onde tem o cacique e líderes representantes, o cacique é  um provedor, um diplomata que representa a comunidade fora da aldeia, e dentro dela, seus núcleos familiares. Um cacique não tem privilégios por ser líder e nenhuma decisão é tomada sem aprovação de todos. Também tem o pajé, que é o líder espiritual, e tem bastante relevância numa aldeia.
 Na sua opinião, há algum item que você considera importante que tenha se "perdido" ? A terra. Hoje o maior problema relacionado aos indígenas no país é a perda de suas terras, a internacionalização econômica, ferozmente tem violentado, expulsado, matado, indígenas em favor de seus interesses . Tem o camuflado e pouco divulgado caso etnocídio, dos Guaranis Kaiowás do Mato Grosso, que há 30 anos vem lutando por direito a terra e que agora com o 'etanol-biocombustível' , completamente ascendido pelo governo Lula e mídias nacionais- uma das soluções para a diminuição do problema de emissão da CO²  no planeta, esta situação se consolidou. No Mato Grosso, os fazendeiros que cultivam a cana-de-açúcar, o tal do ‘Ouro verde’ vergonhosamente violam os direitos humanos. Invadem as terras indígenas demarcadas e reconhecida pela FUNAI, tirando seus direitos as práticas tradicionais, conhecimentos, espiritualidade e condições de vida sustentáveis. Os Guaranis Kaiowás, tem duas opções, vão resistir acampados na beira das rodovias em condições miseráveis ou vão trabalhar como cortadores de cana, desses próprios fazendeiros que os expulsaram. Tem o desconhecido caso da COSAN, empresa paulista que detém a marca do açúcar ‘União’ e o ‘Barra’, que entrou na lista suja do trabalho escravo pelo MTE- Ministério do Trabalho e do Emprego, além da exploração do trabalho infantil, pois muitos jovens adolescentes indígenas Guaranis Kaiowás viram cortadores de cana. Alguns filmes e documentários que indico e abordam esses fatos. 
‘Terra Vermelha’ de Marcos Bechis.
 E os documentários:
‘Mbaraka- A palavra que age’ do Spensy Pimentel/Gianni Puzzo/Edgar Cunha ( este vai ser exibido no programa Etnodoc no canal Brasil no da 4/08 as 00:00).
 ‘ A sombra de um delírio verde’ do Cristiano Navarro/An Baccaert/ Nicolas Muñoz.
E reforço que o que consumimos aqui atinge diretamente aos indígenas Guaranis kaiowás.
 De onde a tribo tira o sustento? Boa parte do sustento da aldeia vem do bolsa família e programas do governo, além de projetos executados pelo terceiro setor, e para algumas famílias da venda de artesanatos ou apresentações de suas tradições, como é o caso do coral Guarani. Mas ainda é forte o descaso do poder público na cidade de São Paulo com os Guaranis Mbyá, a aldeia Tenondé Porã está no bairro de parelheiros na APA- Área de Proteção Ambiental, e muitos paulistanos não sabem,que  temos natureza e ar puro na cidade, o que facilitaria aplicação do turismo ecológico na aldeia, assim como, a geração de renda. 

Explique-nos sobre o seu projeto com as tribos. 
Ano passado, através da Secretaria de Parceria e Participação da Prefeitura apliquei uma oficina de elaboração de projetos, na aldeia indígena Tenondé Porã em Parelheiros na cidade de São Paulo,  pois só se consegue recursos para indígenas através de editais ou instituições corporativas que mesmo assim requer uma elaboração de projeto nos moldais conhecidos e eles são carentes disto. Ao acabar meu contrato com a prefeitura virei indigenista e completamente envolto naquela cultura, aprendo muito com eles e acho que eles tem muito a ensinar para nossa sociedade. Todas as vezes em que acompanho o cacique em palestras, seminários, fóruns, fico extremamente tocado com suas colocações e postura. A política dos guaranis, não é capitalista e nem socialista, é humanista.

Como é o convício do índio com o homem branco? 
 Pacífica, esta é sua natureza, se permitem e gostam deste contato. Mesmo no período do Brasil colônia em que dizimaram milhões de índígenas.
Nos anos 70 na construção da estrada transamazônica, em que momentos belicosos manifestou.
E hoje esta situação no Mato Grosso é por luta e respeito a sua dignidade e sobrevivência neste vasto território chamado Brasil, que tem terra suficiente.  Vale ressaltar aqui, que esses indivíduos sempre foram e serão problemas para o Brasil, governos de várias matizes acumularam e acumulam, promessas não cumpridas, eles continuam sendo humilhados,abandonados, dizimados, perseguidos, expropriados, assassinados ou levados ao suicídio.
E aqui destaco que esses são os portadores da nossa verdadeira história e o coração-de-mãe do Brasil estão com os índígenas  e os afrodescendentes.

Rony Cácio.

Aguardem post sobre Belo Monte.

Haweté !



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